sexta-feira, 23 de março de 2012

Too long, didn't read (dirão vocês).

Não está fácil voltar às aulas. Primeira semana foi boa, recuperei e enfrentei aquele medo. Segunda semana fiquei doente, fui-me abaixo por ter faltado às aulas. Aquele sentimento de culpa por não ter ido foi terrível. Terceira semana foi a pior semana de sempre.

O que vos conto é porque preciso, é porque cá dentro vai um reboliço. Ele vai ler isto, não vai gostar, mas este é o meu espaço e é a minha terapia de grupo.

Começo por segunda-feira. Dia do pai e o namorado ia fazer uma tatuagem. Tinha combinado com ele estarmos juntos antes da tatuagem à porta da minha faculdade (para então irmos para a loja de tatuagens que fica lá perto), quando percebo que as horas passavam e ele nem a sms, nem a chamadas respondia. A minha aula foi cancelada. O meu professor estava doente, tínhamos combinado às 10h30 na porta da faculdade. Como não me respondia decidi insistir para ver se ele acordava para ainda ter tempo de comer. Atendeu. A voz estava ensonada e difícil de perceber, atribuí ao acordar naquele momento e à baixa rede na minha faculdade. Comprei-lhe o pequeno-almoço e fiquei à espera dele. 10h20 e ele não me respondia de novo. Liguei-lhe novamente e ele atende, já estava na rua e por isso a falta de rede não poderia ser desculpa. A voz arrastava-se, as palavras enrolavam-se e um dejá vu surgiu:

‘Quantos comprimidos tomaste?’

‘Diz que não posso ir à tatuagem, tenho uma enxaqueca’

‘Quantos tomastes?’

‘Pra cima dos 14’

Liguei para a melhor amiga dele, voei até casa dele, chamei o inem e passei um dia nas urgências com ele. Não foi fácil, chorei muito, não percebi na altura, não percebi nada. Eu já tinha feito o mesmo à dois anos, foi ele quem me socorreu. Arrependi-me tanto do que tinha feito que a culpa fazia-me doer o corpo todo. Para ele não tinha sido uma tentativa e não se arrependia de nada. As minhas entranhas doíam-me ao ouvir isto. “Porque é que me queres deixar?”, dizia ele à dois anos enquanto me carregava para a ambulância. E nessa segunda-feira nem uma desculpa me pediu, nem um obrigado me disse. Deixei-o a dormir em casa nessa tarde (não o internaram, por estupidez), tirei-lhe todos os medicamentos que estavam à vista. Terça fui às aulas e depois fui ter com ele. Decidi, por medo, ficar com ele. Aguentei o seu mau feitio, aguentei a má educação e a sua agressividade. Chorei por dentro, por fora e se num minuto me apetecia dar-lhe um estalo no outro queria abraça-lo. Faltei às aulas na quarta-feira, quinta-feira foi greve e hoje nem consegui acordar para ir às aulas. Ele não está bem, quero que ele fique bem, mas ele não quer. Não sei como o ajudar, não sei o que fazer.

Os meus pais não sabem de nada, nem quero que saibam, mas eles estão chateados comigo. Tenho responsabilidades e faltei a essas mesmas. Envolve dinheiro, compromisso da minha parte de dois lados (pais e escola da companhia de dança). Não fui às aulas da companhia comprometendo a minha posição lá. Estamos em fase de ensaios e deixo o grupo sempre pendurado. Vou hoje e nem sei como abordar a minha ausência. Não é culpa minha, não é culpa dele. Gostava que percebessem a minha situação, gostava de entrar sem sentimento de culpa. Mas não posso. Assumo os meus erros, que antes não assumia. Mas não me posso justificar.

Não é fácil ter em casa um apoio fraco, saber que para eles tudo o que digo ou faço é inválido, porque a bulimia, estados de ansiedade não são desculpas. Ter uma irmã que por muito que saiba a mais do que os meus pais, me diz que sou um erro, que me critica e se acha em grande posse de o fazer. Poderia tudo ser pior. Podia não ter irmã e pais. Mas sei que com eles não posso contar para estes assuntos. Por isso segui em frente e hoje estou sem anti-depressivos, mais racional e com mais vontade. Porque o fiz por mim, porque o fiz sozinha. Se soubessem disto provavelmente diziam ‘Big deal, nós fazemos isso desde que nascemos’ mas eu não sou eles, nunca escolhi ser doente, nem ter de ir a psiquiatras ou psicólogos. Mas prefiro muito mais viver a ser consumida por energias negativas. E gostava que ele entendesse que tem apoios suficientes, pessoas que o entendem e querem ajudar e que é ele que não se deixa ajudar.

Sei que lês-te isto e gostava que te tocasse no interior, porque sabes bem que é verdade, sabes bem que não são medicamentos que te curam. Isto não é uma gripe, é a tua cabeça a dizer sempre que não à vida. E só depende de ti realizares os teus sonhos.


Fica para vocês isto também. E fica aqui prometido também (e esta promessa fez-me ficar em pausa com as mãos sobre o teclado) que irei às aulas, irei à companhia e não falho mais na minha vida. Assim como tu não vais falhar à tua.

*

12 comentários:

  1. Admiro a tua força, a tua beleza interior. És uma pessoa boa, não tenho a menor dúvida e lamento muito não teres o apoio e o amor que tanto mereces. Não entendo porquê que os anjos não são amparados também...Tu és forte, és pura e escreveste um texto muito sincero. Boa sorte para ti e para o teu namorado.
    Filipa*

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  2. li tudo meu amor, muita força, sei que vais conseguir

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  3. Já vim aqui várias vezes, e já li isto várias vezes.
    De todas as vezes que aqui vim não soube o que te dizer.

    Agora não foi excepção.

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  4. Olá,
    Nós estamos "acostumadas" a estarmos na situação de risco, a sermos as pessoas frágeis, muitas vezes procuramos força em outra pessoa, mas e quando a situação muda e não é mais você a que mais precisa de um apoio? E se agora quem está no abismo é alguém que amamos?
    Te desejo força e paciência em dobro para que consiga cumprir com suas tarefas e ajudar seu namorado, espero que os dois fiquem bem, beijos ;*

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  5. Força querida. A vida é mesmo assim, uma vez somos nós que caímos e precisamos de ajuda, outras somos nós que, mesmo estando em baixo, temos de levantar quem mais precisa. E daqui a uns anos, quando tudo estiver melhor, vais olhar para trás, ver as coisas difíceis por que passaste e passaram juntos e saber que isso só vos tornou mais fortes, individualmente e como casal. Se precisares de alguma coisa, um café, uma conversa, podes contar comigo.

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  6. De vez em quando leio-te =)
    É muito complicada a tua/vossa situação. Espero que não me leves a mal, mas há 2 pontos que me parecem fundamentais tendo em conta o que escreveste.
    1)A melhor amiga do teu namorada não és tu? Parece-me estranho a melhor amiga dele ser outra pessoa;
    2)Tu tens os teus problemas e claro que os dele também são teus, mas as coisas complicam-se muito quando ambos têm problemas psicológicos... talvez não sejam 1 bom par, quem sabe não sejam tóxicos um para o outro?
    Estás a esforçar-te para andares para a frente, e ele está a piorar a tua vida (sei que parece horrível).
    Pessoas deprimidas, que tentam efectivamente acabar com a vida talvez não sejam o melhor 1 para o outro.
    Óbvio que gostas dele e o queres ajudar, assim como ele te ajudou, mas acho que deves pensar em ti e na tua vida e teres 1 conversa séria com ele. Gostar/amar não chega...

    Desculpa se te magoei ou se pareci parva ou insensível, mas às vezes tem que se usar o cérebro que temos.
    Boa sorte para ambos

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    1. Hei Vivi. Nao me magoaste em nada, porque estou certa de certas coisas. A minha posição sobre ele ainda é de namorada,fomos e somos melhores amigos, há coisas que não contamos a mais ninguém. E há coisas que só eu sei e só eu vi. Quando lhe chamo a melhor amiga é porque nem todos os que nos rodeiam são nossos amigos, são conhecidos ou colegas. Mas aquela rapariga é mesmo uma grande amiga dele, sendo a amiga que ele confia mais de entre todos os outros. Em frente dela estarei eu e a família dele. Por isso quando me refiro à melhor é como sendo a amiga em quem ele confia mais. Nunca nos consideramos só namorados, porque crescemos para namorados depois de uma amizade muito forte. Por isso não me considero atrás dela em nada.
      Outra coisa é que ao contrário dele, neste momento estou muito forte psicologicamente. Não estou curada, longe disso. Mas estou muito mais racional e consigo suportar muitas coisas. E penso que ele já o tenha sido. Porque aguentou tanto de mim, muito mais do que alguma vez aguentei dele. Apesar da condição dele e do estado dele neste momento, consigo conciliar tudo. Gosto muito dele, amo-o muito, mas ele neste momento tem de se tratar primeiro. Porque sei e sinto que ele está longe de mim. Até lá ajudo-o como me ajudou a mim. E pronto. :)
      Aguento bem isto, pelo menos agora. Quando se gosta, luta-se. E faço-o agora. E don't worry, eu fico bem.

      *

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  7. Imagino o quão doloroso é ver uma pessoa sofrendo o que você sofreu e não poder fazer nada para que ela acorde e não cometa os mesmos erros.
    É estranho, mas o melhor que você poderá fazer é ficar ao lado dele. Não interessa o que ele faça, você não vai poder tirar a culpa que o outro sente de uma hora pra outra.
    Agir agressivamente é uma consequência aceitável, até. Nós brigamos com quem mais nos ama porque ela nos que ver bem e quem quer nos ver bem, briga, perturba e as vezes é chata mesmo.

    Enfim, a dor que você sente agora, foi a que ele sentiu a anos atrás. Assim como ele te ajudou a sair desse buraco imenso, ajude-o também. Mas sem pressa, sem forçar ao extremo, se não a corda rompe.

    se cuida.

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  8. Quase que chorei, é tão trágico e lindo ao mesmo tempo. Tens tanta coragem e força, um coração de ouro mesmo e espero que vocês os dois vençam a luta contra esse bichinho na cabeça, porque são o suficientemente fortes pra ir contra tudo e todos. Vive a vida da melhor maneira, assume as tuas responsabilidades, dança e sente-te a ti mesma em tudo o que fazes. Bjinhos e força

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  9. Fiquei uns minutos a olhar para o ecran sem saber o que escrever...
    e ainda não sei o que dizer...apenas posso dizer-te que gostava de não ter lido nada do que li , mas li e fiquei triste por ti...
    Posso não te conhecer mas tenho acompanhado todas as tuas lutas e todos os teu progressos e merecias e( nós mereciamos) um post cheio de felicidade por que é o que esperamos para ti há muito tempo..(nesta" terapia de grupo")
    e esse post vai chegar e eu vou ler porque vou estar sempre aqui por perto...
    espero que tudo esteja melhor hoje e seja sempre melhor amanha
    tu es grande bubbles não te esqueças disso
    bjs

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  10. é castanho. mas de vez em qnd em maré de sentimentos mais negativos gosto de o pintar de preto. ainda por cima sou mt branca, fica um contraste grande. eu gosto.

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